sábado, 29 de junho de 2013

#19 - O não dito

written by Larissa Rainey at 22:57
Insanity by ~starg691

O pedestal que te colocam é falso. As construções sociais que elevam a sua importância são decrépitas e fracas. A sua voz clama pela atenção que recusam a te dar. Os seus berros assustam o coração que está cansado de bater no ritmo da ansiedade. As suas lágrimas denunciam o medo de enfrentar a escuridão. O brilho verde dos seus olhos ecoa o nada da sua alma.
O que você vê quando está em frente ao espelho? Você perde tanto tempo dissecando os defeitos da sua carne que esquece dos pontos mofados do seu interior. Conta cada prato de comida, atribui pontos a cada um deles. Engole qualquer pílula que deixe seu corpo bonito. Mede cada centímetro da sua pele, esfrega qualquer loção para tentar camuflar os sinais do tempo e da vida. 
Mas mãe, você sempre foi bonita. 
Pena que esqueceu de alimentar o que está aí dentro, escondido, esperando. A raiva cava buracos profundos na pele sangrenta e macia do seu coração. As palavras afiadas distanciam quem você carregou no útero. O  medo da escuridão fez com que você repousasse sua cabeça em qualquer luz. Expectativas exageradas esfolam a suavidade da sua voz e te deixa áspera, violenta e insalubre. Desgastou tanto a si mesma que seus ouvidos querem parar de ouvir o mundo ao seu redor.
E se as coisas tivessem sido diferentes?
E se naquele 30 de novembro, tudo tivesse acabado? Talvez você seria obrigada a encarar a escuridão profunda que te cerca. Teria que anunciar para o mundo que você errou, e que não havia mais conserto dali em diante. O quarto que você tanto odeia ficaria vazio para sempre, com memórias fantasmagóricas da pessoa que um dia você chamou de maldita.
Não adianta pensar no que poderia ser. Suas palavras nunca vão se abrandar, e eu ainda estou aqui. A escuridão que você tanto teme é minha amante. Eu conheço cada toque e cada sussurro dela. Sei bem como é segurar cada curva de seu corpo frio e rígido. Estive em  lugares que não ouso voltar novamente - os mesmos lugares que você tenta preencher com fotos falsas.
Mas eu estou me libertando. Por que você ainda se prende?

(Texto inspirado pela música Mother, do Yann Tiersen.)

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